quarta-feira, 22 de junho de 2022

Memória do eleitor ou eleitor sem memória

Uma das grandes mudanças ocorridas na política brasileira nos últimos 30 anos diz respeito ao comportamento dos eleitores em relação à candidaturas. Como votam os eleitores, é a grande pergunta que estudiosos do comportamento eleitoral, marqueteiros e políticos costumam fazer, principalmente nos momentos que antecedem uma eleição.

Sabemos que a decisão do voto é resultado de muitos fatores, dentre os quais os estudiosos destacam: as escolhas feitas no ambiente familiar, a fidelidade em relação à candidatos ou partidos políticos, as promessas feitas pelos candidatos durante o certame, a troca de favores, prometida ou já realizada, entre candidatos, seus cabos eleitorais e eleitores, dentre outros motivos mais específicos.

O desencanto com a política, que tem marcado a realidade brasileira nos últimos anos tem, cada vez mais, dificultado o entendimento acerca da decisão do voto, na medida em que cresce de forma exponencial, o desinteresse da grande maioria da população pela escolha de seus representantes.

As famílias já não possuem uma identificação partidária sólida, não existem mais, lideranças políticas fortes, que possam explicar a identificação do eleitor e o seu consequente seguimento. Os grupos políticos são cada vez mais frágeis e, por isso, movidos pelo oportunismo eleitoral do momento, o que implica a não fidelidade do eleitor. Sobram, a troca de favores, o voto interesseiro, sem qualquer substância realmente política, no bom sentido da palavra.

No Rio Grande do Norte, por exemplo, a história polarizada dos processos eleitorais, sempre levou à uma forte identificação dos eleitores por um dos grupos ou partidos concorrentes. Aluízio X Dinarte;  Alves X Maias, por exemplo, eram polarizações fortes, que levavam à uma nítida opção política eleitoral, que se expressava no uso de determinadas cores, em bandeiras e no vestuário do eleitor. Os indivíduos se autodenominavam “gentinha”, “bacurau”, “arara”, “tucanos”, dentre outras expressões, e a disputa entre esses grupos eram fonte de intrigas e muito conflito entre os eleitores, principalmente nas pequenas cidades.

Hoje, tudo isso acabou! Os grupos políticos estão cada vez mais frágeis, os partidos políticos perderam suas identidades e as grandes lideranças, dotadas de carisma, de discurso e de projetos, já não estão mais entre nós. Os eleitores ficaram órfãos e já não tem o menor interesse pela política.

      Diante de tudo isso, um fato chama a atenção dos que estudam a política ou daqueles que orientam candidaturas: a falta de memória do eleitor em relação às suas escolhas nos processos eleitorais. As pesquisas demonstram que a grande maioria dos eleitores não sabe em quem votou nas últimas eleições, principalmente na eleição proporcional, o que torna o voto, algo transitório e o comportamento eleitoral, extremamente volátil. Apenas os partidos de esquerda mantêm, ainda, algum grau de fidelidade eleitoral, devido à história de militância que deu origem a esses partidos.

O voto, assim, é, para a grande maioria, totalmente desinteressado, e porque não dizer, descomprometido com as candidaturas, porque descomprometida também é a postura dos candidatos em relação ao seu eleitorado e aos problemas da sociedade.

A política então se torna, uma terra de ninguém, e os processos eleitorais um verdadeiro vale tudo para conseguir uma vaga no sistema de representação.

Quadro triste para uma democracia representativa cada vez mais frágil e mais distante da sociedade.


segunda-feira, 2 de maio de 2022

As perdas

Uma das coisas mais difíceis de se encarar quando já ultrapassamos o cabo da boa esperança (50 anos), é a partida das pessoas que, em nossa vida, foram referência para nós. Os avós, os nossos pais, os nossos tios, os nossos irmãos, primos e amigos. Aqueles que nos serviram de modelo, que nos deram lições através do exemplo, e aqueles que nos conquistaram pelo tanto de amor que dedicavam aos seus. É sempre muito triste nos despedirmos dos que amamos. A sensação da separação definitiva e a tristeza que nos invade, diante dessa realidade, parece tirar o nosso chão, na medida em que vai embora com as pessoas, a sua companhia, o seu apoio, o seu amor que era a liga que nos unia.

Lidei com perdas desde muito cedo. Perdi meu pai quando tinha apenas 03 anos, e pela idade que eu tinha na época, não experimentei a dor da perda, mas sim o vazio da figura paterna na estrutura familiar. Com o passar do tempo fui perdendo tios, primos, naquela sequência natural da vida. Os mais velhos, aos poucos, se despediam da vida.

Após os 50 anos, esse processo que parecia natural, começa a assumir uma nova conotação e a ter um sentido diferente na nossa estrutura emocional. Perdi minha mãe aos 56 anos e posso afirmar que, naquele dia, o meu mundo pareceu desabar. Me senti perdida, vivenciando a maior dor que já sentira na vida. Perdi amigos queridos que foram parte importante da minha história, da minha juventude...Perdi familiares queridos que eram parte da minha casa, da minha vida...Perdí a segunda mãe que a vida me deu, e assim segui perdendo minhas referências e pedaços da minha história.

A pandemia da COVID acelerou, de forma cruel, esse processo. Em apenas dois anos perdi um irmão, um compadre querido, perdi alunos, professores, amigos e conhecidos. Pedaço da minha geração começou a nos deixar...

Essa semana mais uma perda. Sem tempo de se despedir, partiu nossa prima Zélia, a última referência familiar que eu ainda tinha de Acari. Uma pessoa moldada na bondade, na simplicidade, no acolhimento e no cuidado com os outros. Aquela que fazia a melhor tapioca do mundo (pra ela não tinha parêa), e que amava receber a família com a fartura de uma mesa, tipicamente seridoense, e a preocupação de agradar a todas as preferências gastronômicas, dos adultos e das crianças. Não sei se, em Acari, havia alguém que não gostasse de Zélia, mas pela quantidade de pessoas que foram se despedir dela, na última quinta-feira, acredito que essa pessoa não existe.

Fica com Deus, Zélia! Por aqui teremos sempre histórias pra contar sobre você. Porque poucas pessoas ocupam um lugar tão especial em nossas memórias afetivas .