quarta-feira, 12 de novembro de 2014

A campanha política do medo

Passadas as eleições, esfriados os ânimos, atrevo-me a refletir um pouco sobre o que vivenciamos durante o período eleitoral, o mais atípico período eleitoral já vivido no Brasil. Por que afirmo isso? Porque esse foi um tempo de intensa competição eleitoral, um tempo que nos fez acreditar estarmos vivendo uma dinâmica política realmente democrática. Afinal, como afirmou um renomado cientista política europeu, a incerteza é a marca maior da democracia - "Ama a incerteza e serás democrático', e ninguém pode duvidar da incerteza que marcou o processo eleitoral até os últimos momentos.

No entanto, a nossa (ou a minha?) euforia democrática, não combinou com a forma como os partidos políticos tentaram aumentar o seu capital eleitoral: semeando o medo no eleitorado. Na ausência de um debate propositivo acerca do que cada um pretendia com o discurso mudancista (todos queriam mudanças, inclusive a presidente), a estratégia para ganhar o eleitor foi sempre a de destruir o outro, e na grande maioria das vezes disseminando medo no eleitorado mais vulnerável: o eleitor mais pobre. Um medo sórdido, irreal, que me fez lembrar o medo dos comunistas quando eu era criança: "Comunista come criancinha..." Um medo difundido pelos conservadores durante a primeira campanha eleitoral de Lula para presidente, quando difundia-se a idéia de que caso o PT chegasse ao poder, as pessoas teriam seus bens (fogão, geladeira, etc) confiscados pelo governo.
Nada me parecia mais vulgar do que essa forma de fazer política, disseminando ameaças acerca da possível vitória do outro. 

E essa foi a grande novidade dessa campanha eleitoral. Nada me chocou mais do que aquela propaganda do PT, contra a candidata Marina Silva, que tinha imagens de banqueiros como seres misteriosos e maus, seguido de imagens de uma família pobre na hora da refeição, vendo a comida sumir de seus pratos. A mensagem não explicitada era a de que, caso Marina fosse eleita, a comida ia sumir do prato do pobre, como iriam sumir da casa dos pobres o fogão ou a geladeira, comprada a tanto custo, caso Lula fosse eleito presidente.
O PT, vergonhosamente usou do mesmo recurso pérfido de seus adversários alguns anos atrás. E as mensagens de medo não pararam por aí: a campanha do medo usou de difamação e calúnias para construir o perfil dos adversários, num jogo de vale tudo. E a imagem dos candidatos esteve sempre desfocada por não ter rebatimento em espelhos que refletissem a verdade. O objetivo não era simplesmente ganhar a eleição mas, sobretudo, destruir moralmente o adversário, num comportamento muito pouco republicano. E esse discurso era dirigido, sim, ao cidadão menos informado e, por isso, vulnerável à todo tipo de afirmação que a ele fosse dirigida na campanha eleitoral. Inclua-se nesse eleitorado menos informado, não somente o pobre do nordeste (com muito pouco acesso à informação) mas também  uma grande parcela da classe média que só é informado pelo noticiário da televisão. Que não lê jornais, que não acompanha o debate político, que não consegue ver além do seu mundinho privado.

É, falta muito! Falta muito para a democracia brasileira se consolidar pois, a despeito de todos os avanços, os que disputam o poder a qualquer custo não costumam se guiar por regras ou instituições democráticas. O povo tem feito a sua parte, os políticos não...

domingo, 2 de novembro de 2014

E agora José?

E no aniversário do poeta Carlos Drumond de Andrade, aquela poesia que, para mim, é sua obra prima:

E agora José?

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
 

E agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou...

E agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.

José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse…
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!

José, para onde?

Um dia para pensar nas cadeiras vazias


Hoje é um dia de melancolia para mim. O dia da Saudade. Um dia que me faz lembrar de cadeiras vazias...Lugares antes ocupados por pessoas amadas que se foram e não deixaram substitutos. Como esquecer da cadeira que ficou vazia em nossa casa com a partida de mamãe para o reino do Pai? Aquele lugar vazio não é apenas um lugar físico ( a cabeceira da mesa) mas é, sobretudo um lugar afetivo: o lugar do amor incondicional, o lugar do equilíbrio, o lugar da sensatez, o lugar da verdadeira miseridórdia, o lugar do acolhimento...Um lugar que nenhum de nós será capaz de ocupar, pois nos falta os atributos para tanto. A cadeira ficará vazia, embora a tristeza já não seja tão forte, ainda que teime em voltar em dias como hoje. Ficou uma saudade! Uma saudade que ainda dói quando me deparo com a cadeira vazia...

Uma saudade também de pessoas que ocuparam lugares em outros espaços: os espaços da grande família, o espaço das amizades, da vizinhança, do trabalho...
Saudades de Têca, de Beth, de Branca, de Tia Arciria, de D. Flora...
Saudades de Edda, de Franklin, de Bebeth, de Paulinho Limarujo ...
Saudades de muitos que passaram em minha vida e, nela, ocuparam lugares, hoje vazios...