A recente discussão sobre o novo Código Florestal me fez lembrar um artigo que escreví há alguns anos atrás sobre o tão falado Desenvolvimento Sustentável.
Confira um pequeno trecho desse artigo.
O que é desenvolvimento sustentável?
Há muitas formas de definir o desenvolvimento sustentável (mais de 100 definições identificadas na literatura), sendo a grande maioria centrada na questão ambiental, que deu origem a proposta. A visão que prepondera na América Latina e em espacial, no Brasil, no entanto, está ancorada nos pressupostos da Agenda 21 que aprofunda o sentido da sustentabilidade do desenvolvimento, para além da dimensão ambiental. Para Ignacy Sachs (um dos mais ardorosos defensores desse modelo) o desenvolvimento sustentável deveria estar ancorado em três princípios básicos: a prudência ecológica, a eficiência econômica e a justiça social. Mais recentemente foi incorporada a essa tríade o princípio político da democracia e a preocupação com o componente cultural da realidade. Dessa forma, o desenvolvimento deixa de ser um problema econômico para ser um problema de múltiplas dimensões, o que torna mais complexo o seu planejamento e a sua realização.
Para alguns autores o desenvolvimento sustentável tem que estar cimentado em uma nova base ética, por demandar uma solidariedade social e a necessidade de subordinação da dinâmica econômica aos interesses da sociedade e às condições do meio ambiente. Essa solidariedade que deveria ser intergeracional e interespacial, supõe uma mudança radical nos valores, práticas e atitudes dos agentes do desenvolvimento mas também da sociedade como um todo.
Essa chamada visão holística do desenvolvimento requer assim, um suporte muito forte que lhe dê sustentação, o que talvez explique o aprofundamento, no tempo, da idéia de sustentabilidade para dimensões mais amplas como a política e a cultura.
A primeira grande questão que se levanta diante do desafio do desenvolvimento sustentável diz respeito aos atores sociais promotores desse desenvolvimento. Na medida em que ele supõe uma mudança de prioridades em relação ao modelo economicista-tecnológico, ele representa uma quebra de interesses e práticas, fortemente sedimentados nas instituições públicas e privadas. Em interessante artigo sobre o tema Rich (1994) chama atenção para o paradoxo presente, por exemplo, na atuação do Banco Mundial, que é hoje o principal gestor financeiro internacional de estratégias de desenvolvimento sustentável. Estudos realizados mostram, por exemplo, que, enquanto o Banco destina 2 milhões de dólares para financiar programas de redução de dióxido de carbono na China, se propõe a destinar 310 milhões para a construção de centrais geradoras de energia com base no carvão. Segundo o autor, dos 46 projetos financiados pelo Banco na área de produção de energia, entre os anos 90-94 somente dois incorporaram critérios de conservação ambiental, numa visível quebra do princípio da sustentabilidade.
Este exemplo do Banco Mundial pode ser facilmente estendido aos governos. Atuando geralmente sobre um campo de pressões, os governos costumam incorporar à sua agenda pontos muitas vezes conflitantes, num processo típico de acomodação de interesses. Além disso, as coalizões governistas para chegar ao poder assumem compromissos diversos, que vão desde os assumidos publicamente com o seu eleitorado, até os assumidos privadamente com os financiadores e apoiadores de campanha. Assim, quanto mais extenso esse leque maior a dificuldade de estabelecer agendas.
Se sairmos do Estado para o campo do mercado fica ainda mais distante a identificação de possíveis atores sociais promotores do desenvolvimento sustentável. Os representantes do capital que estiveram sempre na dianteira dos processos de desenvolvimento costumam não reconhecer a validez das questões da sustentabilidade, pois são movidos por interesses puramente econômicos (privados) e muito raramente se identificam com questões de natureza social e ambiental (públicas). O desenvolvimento sustentável procura corrigir as distorções de um modelo que priorizou os seus interesses e supõe uma redefinição de prioridades e formas de atuação que muitas vezes lhes parece exdrúxula.
Diante de todas essas dificuldades a adesão ao padrão do desenvolvimento sustentável é uma decisão extremamente difícil, principalmente para o Estado, principal ator no processo de alavancagem do desenvolvimento na América Latina, tradicionalmente atrelado aos padrões anteriores de intervenção. É por essa razão que, na nossa concepção, o desenvolvimento sustentável para ocorrer precisa estar atrelado a uma reforma do Estado. Não uma reforma restrita ao aparato burocrático das organizações públicas mas uma reforma que englobe a própria sociedade. Isso porque não será o Estado sozinho ou somente as leis de mercado que serão capazes de regular os mecanismos de funcionamento de um padrão de desenvolvimento baseado na sustentabilidade. A sociedade, através de suas organizações, será uma força propulsora indispensável para fazer valer a nova realidade.